por Goimar Dantas
Desde o início dos tempos, as histórias são essenciais à vida humana. Por meio delas, recebemos informações e temos acesso a repertórios que nos permitem dar asas à imaginação e, assim, ampliar nossa capacidade de questionar, inventar, contestar, argumentar, aprender sobre nós mesmos e sobre o outro. Um outro que pode ser visto como o mundo, o diferente, o que está próximo ou distante de nós.
Nesse contexto, os contos de fadas – riquíssimos em simbologias, temas que estabelecem diálogo com a ancestralidade, com mitos e arquétipos que nos conectam ao passado, ao presente e ao futuro – são uma fonte inesgotável de histórias recheadas dos dramas, desejos, dificuldades, acertos, erros e tudo o que diz respeito à experiência humana na Terra. Assim, tais contos possibilitam que nos tornemos, no fundo e na superfície, pessoas mais preparadas e aptas à aventura da existência.
Nessas narrativas, nos identificamos com personagens, seus desafios, lutas, tristezas e alegrias e, por meio de suas “vivências”, vamos, nós mesmos, aprendendo a caminhar, cair, levantar, superar desafios, enfrentar os vilões e antagonistas da vida real e, sobretudo, nos surpreender com a poesia e o encanto dessa jornada.
Vivemos em uma época materialista, burocrática e que vem flertando, cada vez mais, com o retrocesso. Um tempo, em muitas instâncias, contrário às ideias democráticas, à liberdade de opinião, à tolerância para com o diferente. Nos contos de fadas, temos violência, crueldade, trapaças, mas também sede de justiça, de mudança, de esperança em tempos melhores. Daí a importância de nos reconectarmos com essas histórias que nos oferecem um respiro, um portal para ambientes de magia, fantasia, para o encontro com o maravilhoso. Experiências de fruição e de aprendizagens as mais variadas, que nos devolvem mais preparados para enfrentar nossas realidades a ponto de, quem sabe, podermos transformá-las.
Não é à toa que, cada vez mais, crianças, jovens e adultos estão sedentos por literatura, cinema, games e jogos que os transportem para o mundo de magias, encantamentos e mistérios. É importante que pais e educadores aproveitem esse momento para fazer com que os contos de fadas assumam seu papel na mudança que o mundo vem tanto necessitando.
Nas salas de aula do mundo, esses contos são essenciais! Isso porque estamos precisando do papel formador desses livros e textos arcaicos, uma vez que vivemos, não raro, em contextos despóticos, difíceis demais para os sonhadores, para os que criam, ousam, inventam e tentam mudar as coisas para melhor.
A humanidade está maltratando o planeta, desconectada de sua energia vital. Sob pena de desaparecermos como espécie, temos urgência de novos modelos e ações, mas, para isso, precisamos revisitar e aprender com a sabedoria dos textos antigos, repletos do que há de mais humano e imaginativo. O objetivo último da literatura, lembremos, é retratar a experiência humana. Não podemos recusar esse presente.
Como afirma a fada Nelly Novaes Coelho, à página 124 de seu livro Contos de fadas: Símbolos – Mitos – Arquétipos:
Há, na vida, um trabalho a ser realizado, uma luta a ser empreendida por todos nós. E, nesse sentido, a literatura cumpre um papel. Pela imaginação, varinha de condão capaz de revelar o homem a si mesmo, a literatura vai-lhe desvendando mundos que enriquecem seu viver.